27 de nov. de 2008

Evangelização e Marketing


Recentemente o jornal O Estado de São Paulo reproduziu um artigo publicado nos Estados Unidos sobre a prática de diversas igrejas evangélicas usarem o videogame Halo 3 (um jogo extremamente violento que está fazendo muito sucesso) para atrair jovens às igrejas. O argumento é simples: as igrejas precisam e desejam atrair jovens para lhes pregar o evangelho e a mensagem de paz, mas como os jovens parecem não ter interesse neste tipo de assunto, elas decidiram lhes dar o que eles querem (a oportunidade de jogar em grupos um videogame damoda) e depois tentam lhes anunciar a Boa Nova de Jesus. A principal discussão em torno deste assunto é se a experiência do jogo violento no interior da igreja não vai contra a mensagem de paz que a mesma igreja tenta pregar.


Sem entrar na discussão sobre a contradição ou não entre um videogame violento e a mensagem de paz (apesar de que nem sempre o que as igrejas pregam são realmente mensagens de paz), eu quero chamar atenção para o fato de que a lógica por trás desta estratégia pastoral é a aplicação no campo religioso da lógica de marketing: pesquisar os desejos do público alvo e adequar a oferta a estes desejos.

Quando o objetivo maior de uma igreja é aumentar o número dos fiéis, parece-me bastante razoável que se aplique a lógica e as técnicas de marketing ao campo religioso. Pois, se há uma “ciência” bem desenvolvida para atender os desejos de seu público alvo e aumentar a fatia no “mercado” (seja religioso ou um outro) é o marketing. Esta é a razão pela qual o uso da lógica de marketing não está restrito às igrejas dos Estados Unidos, mas também em outros países como Brasil. Há setores das igrejas cristãs que acreditam que a solução para os problemas pastorais e, especialmente, para fazer a igreja crescer (quantitativamente) está no marketing.
Esta proposta é bastante sedutora, pois muitos bispos e lideranças das igrejas estão, com certa razão, preocupados com o número de fiéis. E como as teologias tradicionalmente utilizadas nos seminários e nas pastorais não estão conseguindo solucionar este problema, marketing soa como uma inovação salvadora. Assim, muitas igrejas cristãs (inclusive a católica) possuem ou estão criando institutos de marketing ou algo que se parece com “departamento de marketing” no interior das igrejas.

O maior problema desta tendência é que a lógica profética do cristianismo entra em contradição com a lógica do marketing. As igrejas e pessoas que assumem a missão de anunciar a Boa Nova do Evangelho devem ouvir em primeiro lugar a Palavra de Deus, e não os desejos dos “consumidores”. Pois se missão cristã é simplesmente atender aos desejos religiosos do povo para encher as suas igrejas, o chamado à conversão não faz sentido. A conversão só ocorre porque as pessoas encontram valores e propostas que são diferentes do que estão desejando. Oferecer videogames violentos, adocicar a mensagem cristã ou reduzir as liturgias a shows emotivos pode ajudar a encher as igrejas, mas é também correr um sério risco de esvaziar ou até mesmo negar o evangelho. Por outro lado, eu penso que as igrejas podem e até devem levar em consideração as técnicas de comunicação e de marketing na sua missão profética de criticar as injustiças e desumanidades que marcam o nosso mundo e anunciar a esperança de um mundo mais humano. A lógica do marketing não é compatível com a missão cristã, mas há técnicas e conhecimentos utilizados pelo pessoal do marketing que podem ser aproveitados em outras lógicas. Um exemplo simples disto: o uso das técnicas de comunicação visual na confecção de materiais das lutas sociais.

O equívoco do pessoal que acredita que o marketing é a “salvação” para a pastoral não pode nos levar a outro equívoco de não aprendermos os conhecimentos e técnicas utilizados no campo de marketing, que poderiam ser muito úteis na nossa missão profética.

Jung Mo Sung, Professor de Pós-graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de S. Paulo.

fonte: Celebrai!

Um comentário:

  1. Mano, em primeiro lugar, muito prazer...volta e meia apareço aqui.
    Li esse post e fiquei na crise:será ele uma crítica direta a criatividade na evangelização? E quando Jesus nos dá o exemplo quando ao encontrar com uma mulher em um poço, pede-lhe água e lhe diz que ele é a água da vida? Ele não leu o ambiente e em seguida lhe anunciou o evangelho? E Paulo que diz que se faz de judeu para os judeus e de grego para os gregos?
    Concordo ser por vezes complicado usarmos "iscas" que enganam as pessoas, mas entendo que a mensagem deve chegar às pessoas por meio e métodos diferenciados, afinal o mundo muda, as formas de comunicação também, mas continuamos a dizer: JESUS TE AMA!(vindo muitas vezes seguido da entrega de um folheto!).
    A questão não está em enganar as pessoas, mas sim quebrar o pre-conceito que a mesma tem da mensagem lhe apresentando de maneira mais adocicada, conforme o próprio Jung fala.
    São apenas pontuações no texto que considero importantes serem ditas.
    Aquele abraço!

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